“Budapeste” é uma história de amor pela palavra, pela cidade e também de um homem por uma mulher. Li o livro em duas noites seguidas, na época do lançamento. É um livro denso, forte e me envolveu totalmente. O filme não conta com a mesma força, o grande problema das adaptações... Em suas páginas, Chico Buarque explora várias relações binárias, duplas e espelhadas entre Costa e suas mulheres (Vanda e Kriska), a relação de identidade do homem com as cidades, Budapeste e Rio de Janeiro e o amor pelas línguas: o português e o húngaro (a cena no telefone público - vermelho e de ficha!! - traduz isso quando Costa grava suas palavras em uma secretária eletrônica a saudade de falar 'saudade', 'pão de açúcar', 'Guanabara', 'maracanã', 'marimbondo', 'adstringência'). E entendo essas relações como uma contraposição entre o que é essencial e o que é aparente, o que fica absolutamente evidente na relação entre Costa e Vanda. Ele não aparece, é um ghost writer, vive pela palavra, na busca por suas histórias encomendadas, ela é o que se vê na TV, uma fachada, nada mais. Um aparência, o outro essência. Budapeste, no filme, é amarela sépia em uma fotografia que poderia acrescentar de verdade. Essa afirmação pode soar gratuita, mas é assim que vejo, nenhuma surpresa, nenhum grande choque, apenas algumas pequenas variações sobre o olhar de Lula Carvalho que já deixou sua marca em "Feliz Natal". É bom lembrar que a direção é do grande Walter Carvalho, “fotógrafo que dirige”, como ele próprio se define, mas a produção e roteiro de Rita Buzzar (de "Olga", filme que não gosto). Admirei muito, no entanto, a cena em que Kriska e Costa se conhecem (foi o primeiro encontro dos dois atores também). Gosto ainda da cena absolutamente autoral da estátua esquartejada de Lênin a navegar pelo rio Danúbio e confesso que não fica muito claro para quem vê o filme o fato da história acontecer ao mesmo tempo em que é narrada, em que é escrita. Afora isso achei completamente desnecessária aquela “feijoada completa” e sua tradução para o húngaro à beira mar (lembrando Noel Rosa: “o samba não tem tradução”), sem falar que é ridículo traduzir uca, torresmo e etc, a mim soou fake, cartão postal barato da cidade. Detesto Giovana Antonneli e Paola Oliveira e por falar nisso, os nus do filme, apesar de serem lindos, excedem, aquela pitada a mais que muda o sabor. E achei bem bacana o filme ser falado em húngaro, com legendas em português, e não em inglês, como geralmente acontece, finalmente um grande acerto para o cinema nacional!!
Walter Carvalho é diretor de fotografia de "Lavoura Arcaica" e "Cleópatra", entre outros; co-dirigiu "Cazuza - O Tempo Não Para", com Sandra Werneck e "Janela da Alma", com João Jardim, dirigiu ainda o documentário "Moacir, Arte Bruta".